Quando os Outros Falam de Mim (e Têm Razão!)
Afinal, sei muito bem como é difícil conviver comigo
Poucas coisas são tão naturais do ser humano do que a sensação de ter que se defender das palavras dos outros, quem quer que esses outros sejam. Quem já passou uns cinco minutinhos online sabe bem do que estou falando: As palavras de um total desconhecido sobre algo que você fez ou disse (ou até mesmo é) incomoda muito mais do que você, quando para pra pensar, entende que deveria.
Mas essa é nossa realidade, somos esses serezinhos que se desestabilizam com tamanha facilidade frente um mero verbete. Sempre acho interessante notar a força que um xingamento pode ter, mesmo fora de qualquer contexto. Por exemplo, se alguém chega em outra pessoa e bem do nada usa ali uma palavra que nós, culturalmente, decidimos que é uma ofensa. Talvez elas nem se conheçam, mas fica ali estabelecido um ataque e, consequentemente, uma necessidade de defesa.
Lembro uma vez ouvir Leandro Karnal falar em algum podcast (esqueci agora qual, quando ou mesmo por que) que não ofenderia se xingassem sua mãe de uma palavra culturalmente feia. Ele dizia algo como (vou parafrasear): “Se minha mãe não é isso, então a pessoa não sabe do que está falando. Mas, se minha mãe for, então a pessoa tem razão”. Eu penso parecido, mas não é o que eu observo por aí (faça o exercício aí com seus botões - como diziam os antigos - e pense como seria alguém aleatório, talvez até mesmo desconhecido, falar algo que sua mãe, ou mesmo você, não é).
Então fica aqui estabelecido isso: Uma palavra dita por alguém qualquer, independente se a pessoa tem razão (e provavelmente não tem), pode causar não só um grande desconforto em nossa mente, mas também gera a tal sensação de ter que se defender. Pronto, agora sim podemos falar das palavras ditas por quem nos é bem próximo, independente se a pessoa tem razão (e é provável que tenha). E aí, como lidar?
Entendo que ser pós-jovem é já ter sacado que, mesmo se eu tiver um baita de um autoconhecimento, sempre terei um ponto cego, um tantão de coisas em mim que eu não vou conseguir enxergar, mas quem está do lado de fora tem a vantagem dessa perspectiva. É por isso que é importante prestar atenção ao que alguém que convive conosco tem para dizer sobre como agimos, talvez até sobre quem somos. E talvez a resistência a essa informação venha por eu não conseguir ver, daí ter a tendência a discordar imediatamente. Ou talvez seja só o impulso de me defender mesmo.
Devo dizer também que acho que ninguém chega a esse ponto da vida sem ter escutado alguma boa dose de asneiras sobre si, muitas delas ditas por quem jura que nos ama. Coisas que você escutou e nem deveria ter levado em consideração, porque trouxeram prejuízos consideráveis sobre a maneira como você se entende como pessoa - acontece. E aí, termos passado por tudo isso reforça em nós, inconscientemente, que o que o outro diz e eu não gosto de ouvir é um ataque e eu preciso me proteger (mesmo se a proteção for ignorar por completo, para não passar pelo trauma de novo).
Ou seja, é preciso dar um jeito de saber filtrar o que nos disseram para avaliar se aquilo precisa ser levado em consideração, se é um ponto de vista que vai me acrescentar alguma coisa. E o truque é conseguir fazer isso mesmo no incômodo da ofensa, mesmo na sensação de que é necessário se defender e na vontade de contra-atacar imediatamente. Repito: Como lidar?
Tenho muito mais perguntas sobre respostas sobre esse tema (ou qualquer outro, na real), mas desconfio que a pausa é uma boa estratégia. O corpo quer partir para a ofensa - talvez rebater falando um defeito que aquela pessoa tem, ou trazendo à tona algo que ela fez -, mas a mente escolhe receber aquela informação e guardá-la para análise e avaliação (bem burocrático, né?). E não dá para resolver ali na hora, é o tipo de coisa que leva tempo mesmo, porque tem que deixar a poeira da emoção baixar para conseguir enxergar aquelas palavras e seus significados com mais clareza.
Isso em um primeiro momento, isso em um nível mais básico. Acho que uma fase posterior é compreender que eu não preciso ter medo de concordar com a pessoa que me disse algo sobre mim que eu queria que não fosse verdade. Talvez a sensação que fique aí é que eu estou do lado do inimigo - ou seja, da pessoa que me ataca -, é um sentimento de autotraição mesmo. Mas acho que traição de verdade seria não lidar com um defeito que tenho porque a ideia de tê-lo me desagrada profundamente.
Não sei se eu preciso me defender de quem eu sou para mim mesmo - acho que não, né? Que doideira. Afinal, é melhor me conhecer mais, mesmo se doer, até porque eu convivo comigo o tempo todo e, quanto mais souber quem é esse indivíduo aqui, melhor eu vou saber lidar com ele. Jogar os defeitos para baixo de algum tapete não vai me servir para nada.
No fim das contas, parece que tem horas que eu quero me defender é da minha insegurança de ser visto pelo outro, desse lugar tão vulnerável que me foge completamente do controle. Se um desconhecido me diz qualquer coisa, é fácil deixar para lá, mesmo se o impulso seja o de me proteger. Mas, quando alguém relevante me mostra um espelho que eu não conhecia, vem a dor de mais um defeito para eu ter que lidar - e já tenho tantos, né? Imagina se esse outro descobre os que eu conheço bem, mas ainda não enxergou.
E no podcast…
1, 2, 3, 4! Contando o Tempo com Os Paralamas do Sucesso é o mais novo livro de João Barone, contando sua relação com a música desde a infância e falando um pouco de como é trabalhar com a banda nos últimos 40 anos. No Pós-Jovem, o baterista fala um pouco de como foi escrever a obra, e também de arte, criatividade e outros assuntos que amamos. Sai na terça, 29 de outubro.
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Doida pra ouvir o Barone, meu crush desde a infância! :)